quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

O caos no sistema carcerário nacional

O sistema carcerário brasileiro voltou a ganhar destaque devido aos recentes casos de violência no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão, onde 60 presos morreram em 2013. Todavia, a falência do sistema prisional brasileiro não é novidade. Os fatos se repetem de norte a sul do Brasil. O sistema carcerário brasileiro é o quarto maior do mundo e um dos mais cruéis e desumanos. A questão prisional brasileira é um misto de superlotação, precariedade, funcionários desvalorizados, com salários baixíssimos, incapacidade do Estado de garantir a integridade física desses apenados, guerra de facções, corrupção, tortura, barbárie, inexistência de quaisquer atividades de trabalho ou educação e falta de assistência médica, social e jurídica.

A violência nos cárceres e fora deles são elos de uma mesma sociedade, em que o caso do Estado do Maranhão não é exceção. A violência entre os encarcerados é o efeito da sua desumanização e animalização provocadas pelo próprio Estado. A superlotação e a violência constituem-se em práticas institucionalizadas. O estado do Maranhão é uma miniatura do Brasil. Vale ressaltar que no caso do Complexo Penitenciário de Pedrinhas a ineficiência, a omissão e o descaso não é somente do Poder Executivo, como também do Poder Judiciário, do Ministério Público Estadual e Federal. Todos são responsáveis e deveriam responder pelo caos que permitiram se instalasse no Complexo Penitenciário de Pedrinhas.

Quem passa por um presídio brasileiro, no mais das vezes sai dele pior do que entrou. Mais de 95% do contingente de presos brasileiros são oriundos das camadas pobres e excluídas da sociedade; não existe levantamentos oficiais - e isso já diz muito acerca do sistema, mas se calcula que 90% dos presos voltem a delinquir, ao recuperarem a liberdade. Mais de 50% dos encarcerados, hoje, não praticaram delitos violentos. Lá estão amontoados, jogados como coisas. O sistema não ressocializa, brutaliza. O sistema não reeduca, aumenta o número de soldados para o crime organizado.

O Brasil anualmente registra mais de 50 mil homicídios, baixa esta próxima do número de mortos americanos ao longo de toda a Guerra do Vietnã. O Estado brasileiro abriga no presídio certa facção criminosa chamada PCC, capaz de paralisar a quarta cidade mais populosa do mundo, capital do estado de São Paulo, a ostentar a sua condição de terceira economia latino-americana. A população carcerária conta 548 mil pessoas e os complexos penitenciários dispõem de apenas 310,6 mil vagas. Levantamento do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) registrou, de fevereiro de 2012 a março de 2013, 121 rebeliões e 769 mortes em 1.598 estabelecimentos do País, além de 2.772 lesões corporais. Uma média de 2,1 mortes por dia dentro dos presídios.

“O cenário carcerário nacional, com raríssimas exceções, é de caos. Superlotação, condições aviltantes, falta de assistência médica, social, jurídica. Inexistência de quaisquer atividades de trabalho ou educação. Corrupção, tortura e todas as formas de violência física e psicológica”, diz a especialista Camila Dias, professora do Bacharelado em Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC – UFABC e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP.

“A prisão explicita de forma cabal tais desigualdades, primeiro, pelo perfil de sua clientela: jovens, negros, pobres. Em segundo lugar, a situação degradante das prisões é vinculada diretamente a essa estrutura: na medida em que é uma instituição para segregar jovens negros pobres, não há qualquer interesse político em tornar as condições mais dignas, mais humanas. Ninguém se interessa por preso; preso não dá voto”, diz a doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo, Camila Dias .

O Estado é responsável por tudo o que acontece dentro de um estabelecimento prisional. Deste modo, todas as barbaridades cometidas dentro de um presídio só ocorrem com a omissão, a conivência ou a participação direta de agentes do Estado, incluídos aqui o Poder Judiciário e o Ministério Público que, é bom ressaltar, ao lado do governo estadual são responsáveis diretos. O Estado é responsável pela integridade dos presos.

Para o presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coelho, o problema do sistema carcerário brasileiro só será resolvido quando o verdadeiro estado democrático deixar de ser apenas uma previsão constitucional e passar a garantir o cumprimento dos princípios para todos os brasileiros, principalmente em relação à dignidade humana.

A solução para a violência e a criminalidade no Brasil, por conseguinte, não é só mais justiça social, menos pobreza e miséria zero. É, igualmente, construir presídios que preparem o detento para ser reinserido na sociedade. É indispensável repensar os conceitos de crime, justiça e pena. S É fundamental um chamamento à sociedade civil, a todos os poderes constituídos e às esferas de governo para a firme tomada de iniciativas em prol do enfrentamento às graves violações de direitos humanos no interior do sistema carcerário brasileiro.

Por: Abdias Duque de Abrantes - jornalista, advogado e pós-graduado em Direito Processual do Trabalho pela Universidade Potiguar (UnP), que integra a Laureate International Universities

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